sexta-feira, 26 de junho de 2009

Goldoni, o Molière italiano; e uma nota sobre Carlo Cozzi


Carlos Goldoni tornou-se o Molière italiano após um estágio com atores ambulantes. Incrivelmente prolífico, tornou-se o provedor de inúmeras comédias. Bem como de algumas tragédias, para o teatro veneziano. Trabalhou poderosamente para criar a comédia da vida e da linguagem comuns na Itália, e acabou por ser bem sucedido, durante certo tempo, ainda que a ferrenha oposição do crítico Gozzi lhe tenha causado consideráveis dificuldades.A capacidade molieresca para satirizar a sociedade foi concedida a Goldoni apenas de forma superficial. Ele era mais fácil que incisivo, e talvez seja em grande parte a relativa pobreza da dramaturgia italiana que lhe granjeou a grande consideração por vezes a ele tributada. No entanto, a vivacidade e naturalidade de Locandiera (Mirandolina) onde quatro homens de diferentes classes são astutamente manobrados por uma esperta mulher, produzem uma pequena peça radiante.Por falta de incentivos acabou indo para a França, onde receberia uma pensão vitalícia do rei. Escreveu inúmeras peças em francês, mas morreu na pobreza, em 1793, depois que a Revolução Francesa pôs fim ao salário Real.


Ainda na Itália, Carlo Gozzi (1720-1805) alterou suas peças venezianas improvisadas ao estilo da commedia dell’arte como O Amor das três Laranjas (1761), ou contos de fadas como Turandot (1762) e derrotou Carlo Goldoni (1707-93) em alguns concursos e em popularidade local, pelo menos, na época.

sexta-feira, 19 de junho de 2009

Exercícios para o ator: desenvolvendo técnicas específicas

Uma vez "dono" de um papel em uma peça, ou em uma cena escolhida, você provavelmente começará por examinar o seu papel, a fim de descobrir o que precisa fazer (você poderá inclusive vir a contar as linhas que lhe couberam a fim de satisfazer o seu ego). Poderá descobrir que entre os seus deveres estão, por exemplo, o de chorar, rir ou bater em alguém no palco. Talvez você fique excitado com relação às possibilidades dramáticas inerentes a tais situações, mas também é possível que você fique assustado antevendo um possível fracasso.

Regras

Há poucas regras minuciosas para se comunicar a emoção num palco. Mas há alguns métodos eficientes, que serão discutidos em seguida. Descubra qual deles funciona para você e bom proveito. Seu diretor dificilmente terá tempo para chamá-lo num canto e explicar-lhe como expressar uma determinada emoção. Lembre-se de que você estará no palco com outro ser humano. Seria terrível ter de contracenar com um ator auto-indulgente, cujo riso ou choro o deixasse com o fracasso estampado no rosto. Tarefas físicas ou emocionais no palco não constituem objetivos ou resustados em si; elas devem ser vistas como resultados naturais, que se desenvolvem a partir de determinados objetivos e do partilhar de momentos dramáticos entre colegas atores.

CHORAR

Procedimento - sente-se em posição relaxada. Tente se lembrar de um acontecimento triste do passado recente. Nesse processo de lembrança, procure se concentrar nos aspectos sensoriais do mesmo, recriando os momentos mais intensos de sua dor em associação com os cheiros, gostos, sons e percepções visuais que o afetaram naquele momento. Tente centrar a sensação na área pélvica e "dirija" a respiração para esta área de maneira lenta e ritmada, à medida que vai se lembrando das imagens sensoriais.

Boceje e procure manter a sensação do bocejo em sua garganta durante a inalação e a exalação. Faça isso durante um minuto. Em seguida, comece a vocalizar a inalação suavemente. Pense na exalação como a maneira de se relaxar, a fim de propiciar o processo de vocalização. Deixe sua inalação passar pelas cordas vocais produzindo assim um gemido suave. Faça isso durante um minuto, lembrando-se de manter a sensação de bocejo na garganta. Chegue ao clímax do exercício acelerando o ritmo e arfando a cada inalação até chegar ao ponto máximo, sem muito esforço. Tente escontrar um ritmo staccato próprio para a inalação. E, finalmente, enquanto estiver exalando, faça a devida vocalização, em forma de queixume. Alcançando o choro, vá diminuindo o ritmo gradativamente.

Discussão - a "memória sensorial" foi necessária? O ato de bocejar foi suficiente para umedecer os seus olhos? Você descobriu que manter o bocejo lhe dá uma sensação de ter um "nó na garganta"? Conscientemente procure produzir o mesmo som que conseguiu durante o exercício, mas use a exalação, ao invés da inalação.Qual dos métodos requer mais tensão? Usando a exalação para recriar o som faz você repuxar as cordas vocais? O som teatral do choro deveria ser conseguindo "exatamente aí", durante a inalação. Entretanto, a inalação poderá lhe dar a sensação de ter a garganta ressecada. Tente relaxar durante esse processo, de inalação, usando a exalação para aliviar a garganta.Engula e produza salivação, se sentir secura. E não tente com desespero.

Quanto maior for a intensidade do exercício, maior a intensidade dramática. Qual a diferença entre um som contínuo e um som staccato? Procure fungar pelo nariz em intervalos entrecortados. Isto faz o choro parecer mais real? Contagia a platéia?

É imprescindível produzir lágrimas verdadeiras? Você poderia conseguir isto fazendo uso de truques requintados? Um ator não deve ter a obsessão de querer "chorar lágrimas de verdade". Lágrimas podem ser o produto de um objetivo frustrado que você está está tentando alcançar, mas concentrar-se exclusivamente nelas faz você negar a existência de outros atores que possam estar no palco com você. Há outras técnicas de chorar - olhar para dentro do "Leeko" (instrumento luminoso) fará, com certeza, com que lágrimas apareçam, mas também vai prejudicar a retina do seu olho. O ator nunca deve pôr em risco seu físico ou seu bem-estar em prol do "sucesso do espetáculo".

Chorar também oferece alguns perigos. Você tem que saber quando termina o choro e quando começa a auto-piedade. A platéia não vai querer entrar em contato com ela. Chorar no palco pode ser muito bonito, dependendo de sua atitude. Se você usa o choro para chamar a atenção da platéia sobre você, então não mais estará contracenando com os colegas. Um crítico experiente vai chamar isto de "golpe baixo".

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Artigo extraído de "The Student Actor's HandbooK", L. J. Dezseran; Mayfield Publishing Co., 1975. Tradução de Thaís A. Balloni. O presente artigo, aqui reduzido - o restante está focado no riso - consta da edição da revista Cadernos de Teatro nº 82/1979.

segunda-feira, 15 de junho de 2009

Egito e Antigo Oriente (Introdução)

A história do Egito e do Antigo Oriente Próximo nos proporciona o registro dos povos que, nos três milênios anteriores a Cristo, lançaram as bases da civilização ocidental. Eram povos atuantes nas regiões que iam desde o rio Nilo aos rios Tigre e Eufrates e ao planalto iraniano, desde o Bósforo até o Golfo Pérsico. Nesta criativa época da humanidade, o Egito instituiu as artes plásticas, a Mesopotâmia, a ciência e Israel, uma religião mundial.

A leste e a oeste do mar Vermelho, o rei-deus do Egito era o único e todo-poderoso legislador, a mais alta autoridade e juiz na terra. A ele rendiam-se homenagens em múltiplas formas de música, dança e diálogo dramático. Nas celebrações dos festivais, em glorificação à vida neste mundo ou no além-mundo, era ele figura central, e não se economizava pompa no que concernia à sua pessoa. Esta era a posição dos dinastas do Egito, dos grandes legisladores sumérios, dos imperadores dos acádios, dos reis-deuses de Ur, dos governantes do império hitita e também dos reis da Síria e da Palestina.

No Egito e por todo o antigo Oriente Próximo, a religião e mistérios, todo pensamento e ação eram determinados pela realeza, o único princípio ordenador. Alexandre, sabiamente respeitoso, submeteu-se a ela em seu triunfante progresso. Visitou o túmulo de Ciro e lhe prestou homenagem, da mesma forma que o próprio Ciro havia prestado homenagens nas tumbas dos grandes reis da Babilônia.

Durante muitos séculos, as fontes das quais emergiu a imagem do antigo Oriente Próximo estiveram limitadas a alguns poucos documentos: o Antigo Testamento, que fala da Sabedoria e da vida luxuosa do Egito, e das narrativas de alguns escritores da Antigüidade, que culpavam uns aos outros por sua “orientação notavelmente pobre”. Mesmo Heródoto, o “pai da História”, que visitou o Egito e a Mesopotâmia no século V a.C., é freqüentemente vago. Seu silêncio sobre os “jardins suspenso de Semíramis” diminui o nosso conhecimento de uma das Sete Maravilhas do mundo, e o fato de o pavilhão do festival do Ano Novo de Nabucodonosor permanecer desconhecido para ele priva os pesquisadores do teatro de valiosas chaves.

Nesse meio tempo, arqueólogos escavaram as ruínas de vastos palácios, de edifícios incrustados de mosaicos para o festival do Ano Novo, e até mesmo cidades inteiras. Historiadores da lei e da religião decifraram o engenhoso código das tabuinhas cuneiformes, que também proporcionaram algumas indicações sobre os espetáculos teatrais de antigamente.

Sabemos do ritual mágico-mítico do “casamento sagrado” dos mesopotâmios e temos fragmentos descobertos das disputas divinas dos sumérios; somos agora capazes de reconstruir a origem do diálogo da dança egípcia de Hator e a organização da paixão de Osíris em Abidos.
Sabemos que o mimo e a farsa, também, tinham seu lugar reservado. Havia o anão do faraó, que lançava seus trocadilhos diante do trono e também representava o deus/gnomo Bes nas cerimônias religiosas. Havia os atores mascarados que divertiam as cortes principescas do Oriente Próximo antigo, parodiando os generais inimigos e, mais tarde, na época do crepúsculo dos deuses, zombavam até mesmo dos seres sobrenaturais.

Ao lado dos textos que sobrevivem, as artes plásticas nos fornecem algumas evidências – que deve, entretanto, ser interpretadas com cuidado – a respeito das origens do teatro. As “máscaras” ornamentais do palácio pátrio em Hatra, as máscaras grotescas nas casas dos colonos fenícios e Tharros ou as representações das cabeças dos inimigos derrotados, pendendo de broches dourados e com relevos de pedra – tudo isso dá testemunho de concepções intimamente relacionadas: o poder primitivo da máscara continua a exercer seu efeito mesmo quando ela torna decorativa.

Os motivos das máscaras antigas – a despeito de algumas interpretações contraditórias - não impedem , fundamentalmente, especulações a respeito de conexões teatrais, mas mais necessariamente permanecem como suposições no enigmático panorama do terceiro milênio a.C.

O solo pobre e castigado pelo sol do Egito e o Oriente Próximo, irrigado erraticamente por seus rios, assistiu à ascensão e à queda de muitas civilizações. Conheceu o poder dos faraós e testemunhou as invocações do culto de Marduk e Mitra. Tremeu sob a marcha pesada dos arqueiros assírios em suas procissões cerimoniais e sob os pés dos guerreiros macedônios. Viu a princesa aquemênida Roxana, adornada com os trajes nupciais e escoltada por trinta jovens dançarinas,a lado de Alexandre, e ouviu os tambores, flautas e sinos dos músicos partas e sassânidas. Suportou os mastros de madeira que prendiam as cordas para os acrobatas e dançarinos, e silenciou sobre as artes praticadas pela hetera quanto o rei a convocava para dançar em seus aposentos íntimos.
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BERTHOLD, Margot. História mundial do teatro. São Paulo: Ed. Perspectiva, 1990.

quinta-feira, 11 de junho de 2009

Improvisação

Dwight Steward

A última edição do imponente Oxford Companion to the Theatre não contém o termo improvisação. O que é estranho, uma vez que a arte de improvisar em torno de conversas ou situações constituía a espinha dorsal da Commedia dell'Arte italiana; isso para não falar das muitas peças de teatro "improvisado" encenadas na própria Oxford. A omissão se torna ainda mais estranha se considerarmosque a produção original de Joan Littlewood de Oh!, que delícia de guerra! nasceu a partir de reações improvisadas de sua companhia a certos fatos históricos das guerras. Da mesma forma, o texto de grande sucesso Viet Rock, de Megan Terry, teve sua forma final moldada pelos próprios atores. Hoje, grande número de professores de teatro - bem como muitos psicólogos - usam a improvisação como uma técnica para o entendimento de um personagem (ou de si mesmo) ou para construir papéis numa peça.

Descrição

A descrição mais simples da improvisação como forma dramática pode ser encontrada no título de uma série de improvisações publicadas alguns anos atrás por Kenneth Koch. Ele chamou seus textos de "Projetos", e no teatro improvisado o projeto ou esboço da peça é dado pelo autor. Após o que, diretor e atores estruturam e compõem - a partir das sugestões proporcionadas - a substância e o significado mais profundo do trabalho. Obviamente, para poder se adaptarem a circunstâncias locais específicas, peças improvisadas devem ter um alto grau de adaptabilidade e mudança. Para se alcançar o maior impacto político, a questão da atualidade deve ser explorada ao máximo. A maior parte do teatro radical de hoje não trabalha com improvisações que "sirvam para todo o país", e sim com temas relacionados a problemas específicos e típicos de certas comunidades, que possuem uma identidade particular. Isto deve ser levado em conta nas produções.

Adaptação

Tal adaptação não deve ser difícil. Improvisações dependem mais da vivacidade e habilidade dos atores do que de cenários, figurinos etc. Além do que, podem ser apresentadas praticamente em qualquer lugar. Além disso, adaptar improvisações a situações particulares (ou escrevê-las para ocasiões específicas) permite ao grupo tirar o máximo proveito de quaisquer habilidades específicas, tipos de voz, cacacterísticas etc., que os membros do grupo possuam. Alguns membros da audiência podem ser chamados para participar de uma peça improvisada - seria até bom que isso acontecesse. Assim, por exemplo, se você estiver levando uma peça de protesto em prol de melhores condições de moradia em uma favela, e se você conseguiu reunir um grande número de pessoas, a primeira coisa a ser feita é dramatizar as condições desses inquilinos, com um texto construído em torno da exploração que eles sofrem.

Surpresa

Essa dramatização deve ser repetida em seguida, agora com pelo menos um membro da assistência tomando parte. Fica-se em geral bastante surpreso com a boa qualidade das contribuições trazidas por esse elemento da platéia. E também, essa espontaneidade e imediatismo quebram a barreira existente entre você como ator e eles como audiência, além de prover um maior senso de participação. Pode-se sempre aprender algo que poderá ser incorporado à peça em uma futura encenação. De um modo geral, pode-se dizer que a audiência é um grande professor e as improvisações podem tanto ser rigidamente estruturadas como flexíveies e abertas. Vejamos exemplos dos dois tipos.

Regras do Jogo

Conheça a audiência para a qual você está epresentando e saiba precisamente qual o impacto que você espera obter.

Assegure-se de que entendeu bem as principais colocações - tanto do aspecto dramático como político - do texto com o qual você está trabalhando.

Use as melhores partes do trabalho improvisado para reforçar esses pontos.

Faça com que diferentes membros do grupo improvisem diferentes partes do texto. Talentos aparecem de onde menos se espera e devem ser sempre aproveitados.

Use música sempre que possível.

Guarde bem aquilo que funciona nos ensaios e guarde esse material sempre que for possível. O mesmo serve para as apresentações. Lembre-se que boas tiradas podem ser utilizadas em diferentes textos improvisados.

Sempre que possível, sirva-se do humor e da sátira. O humor é excelente para relaxar a platéia, além de servir como corretivo para superdoses de cansativa retórica.

Os atores deveriam "praticar" entre si a fim de desenvolver o hábito de entrar numa situação ou num personagem rapidamente, tirando o melhor proveito possível.

Ensaie. Você pode estar defendendo o lado certo da coisa, mas isto não significa necessariamente que a competência teatral per se esteja por isso garantida.

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Artigo extraído de Stage Left, The Tanoizer Press, 1970; tradução de Viroca Fernandes.

domingo, 7 de junho de 2009

Molière


Molière - Jean-Baptiste Poquelin - (1622-1673)tinha como tema central de sua obra o deslumbramento da burguesia ascendente com o estilo de vida aristocrático da Corte. Na medida em que ganhou prestígio fazendo suas críticas de costumes, ao fazer muitas das vezes uma profunda análise da sociedade, dos erros humanos, dos artificialismos e dos interesses mesquinhos que regem as relações humanas, mais do que os muitos inimigos burgueses e mesmo da nobreza e do clero, Molière transformou a comédia, de gênero de menor expressão, em gênero igualmente importante.Molière esteve sempre às voltas com polêmicas. Escola de mulheres e Escola de maridos lhe trouxeram a repulsa da burguesia moralista; Don Juan foi acusado de complacência com a libertinagem; O Tartuffo foi interditada durante anos pela rainha mãe. Molière ainda arrumaria problemas com outras categorias como os médicos, mas mesmo assim era o único considerado "Le comediant du Roi". Foi traído por suas três mulheres, mas quando o autor de O Avarento faleceu sua primeira mulher vai ao Rei implorar por uma sepultura digna.Ainda jovem resolveu fundar a Illustre thèâtre junto com Madeleine Bejárt, em 1644. Depois de fracassar em Paris com um repertório que incluía peças de Corneille, du Ryer e Hermite, em um ano foi a falência e teve que liquidar o grupo. Neste mesmo ano Poquelin adota o nome de Molière, provavelmente, em homenagem a um amigo dono de um bar que oferecia bebida de graça para o grupo.E já que Paris não oferecia as condições necessárias para o sucesso, ele e Bejart se uniram a um outro grupo de atores e partiram em excursão pelo interior do país durante treze anos.Molière representou várias tragédias, mas sempre se destacou nas comédias, sobretudo quando representava suas próprias comédias. As comédias de Molière tem, em geral, cenas bem armadas, mantém a tensão que o teatro, costumeiramente, exige. Seu estilo unia o estilo ligeiro da comédia dell'arte com a métrica clássica da poesia do neoclassicismo francês. Seus personagens eram levemente inspirados na comédia dell'arte, a caracterização dos personagens extraia efeitos cômicos imediatos.Seus diálogos eram curtos e vivos para a época. Seus diálogos retratavam o cotidiano de um século onde imperava a falsa elegância e a hipocrisia.

quinta-feira, 4 de junho de 2009

Estilo da obra e interpretação

Michel Saint-Denis

A noção de estilo é hoje impopular; ela é ao mesmo tempo confusa, particularmente nos países que, em sua língua nacional, não possuem obras antigas e daí não poderem confrontar ou referir suas produções contemporâneas ao conjunto de obras que possuem os países velhos pelas suas tradições. A palavra "tradição" está abandonada; ela é justamente suspeita; por não poderem se transmitir, as tradições esterilizam as obras e as embalsamam; a fidelidade às "tradições estabelecidas" em alguns planos elevados, só pode originar convenções e por isso elas corrompem as obras que desejam servir. Não é de admirar-se que seja justamente nos países de "tradição" que a noção de "estilo" seja impopular ao máximo - os "tradicionalistas" manipularam o "estilo" durante muito tempo, como uma defesa contra qualquer mudança, contra qualquer evolução natural. Eles agora estão completamente derrotados - as tradições estão condenadas e a noção de estilo, acusada de favorecer o artifício e a mentira está afastada por ser convencional e retrógrada.

Luta

Na verdade, de maneira geral, países novos e países antigos combinam hoje suas forças mais vivas e mais adiantadas para entrar em luta contra os valores profundos que estão na base de nossas civilizações desde a Renascença e disso resulta de um lado uma reação salutar de onde emanam novas obras de características múltiplas e contraditórias que testemunham os tormentos e a riqueza de nosso tempo e, de outro lado, suscita seja a rejeição rápida de obras relativamente recentes consideradas retóricas, formais ou preciosas, seja a adaptação de obras antigas interpretadas "à maneira moderna", desprezando-se o estilo original, em negação a qualquer valor "tradiconal". Mas aqui é necessário discriminar.

Concordância

Quando uma época é passada, o que vai constituir sua tradição são as obras que permanecem e que são dotadas de força necessária para sobreviver. É evidente que cada época subsequente não poderá interpretar essas obras passadas de maneira viva senão conforme o espírito que lhe é próprio. E ainda é necessário que haja uma concordância entre esse espírito e a própria natureza da obra, de modo que o texto a revele, apenas o texto, despojada de todas as "tradições de interpretações" de uma época anterior. As tradições de representação são muitas vezes frívolas e efêmeras. Mas parece-me importante afirmar diante de um auditório preocupado com a formação teatral, que na arte dramática de cada país se constitui pouco a pouco uma tradição autêntica, que lhe é transmitida pelos textos, em língua original (somente pelos textos e na língua original apenas) e que o sinal e o instrumento dessa tradição é o estilo. Eis que voltamos à noção de estilo.

Estilo

O estilo não é monolítico. Não me ocupo do estilo de um período. Não confundo aqui estilo com período histórico. O que me interessa, em vista de nosso estudo dos diferentes tipos de improvisação, é o estilo de uma obra. Ouvi Peter Brook dizer que, em determinada obra de Shakespeare, há todos os estilos - do naturalismo à poesia épica ou lírica. Para mim, o estilo das grandes obras de Shakespeare é feito dessa verdade; a unidade de estilo não se destrói mas se enriquece. O que chamo de estilo de uma obra é a sua forma.

Revelação

A figura revela o homem - a figura de um homem não é sempre fácil de decifrar, mas ela conta, ela é testemunha de uma vida quando chega a velhice. A forma de uma obra demonstra a natureza dessa obra, de sua idade entre as obras de um mesmo autor; o estilo expressa o conteúdo de uma obra, como a figura representa o homem - é inimaginável separar ou mesmo distinguir estilo e conteúdo. Quem dirá qual deles deu nascimento ao outro? Poderá haver conteúdo não havendo forma? Samuel Beckett me dizia que sua intenção, seu pensamento só existiam a partir da forma, que antes da forma ele não sabia exatamente o que iria fazer com seu pensamento. E essa forma é o estilo, ligado à obra, como a pele está ligada ao ser.

Coração

A figura é às vezes secreta; também o estilo. É preciso saber decifrá-lo para chegar ao coração da obra. É preciso saber reconhecer um estilo e isto não é fácil. É muito difícil ler uma obra de Shakespeare (no texto original) e deixar o estilo, em sua variedade, vir à tona (e estilo não é só linguagem, é também composição); para mim, é necessário, antes, uma atitude objetiva - o subjetivo terá sua oportunidade de revanche - mas creio que o essencial, no início, é manter a obra à distância, questioná-la sem cessar, antes de se apaixonar por ela e possuí-la.

Dificuldade

A mesma dificuldade existe para todas as obras verdadeiras; quem diz obra verdadeira, de qualquer época, dis estilo. Conheceis o famoso exemplo de Tchecov e da Gaivota. A peça foi primeiro representada por um teatro acadêmico, conforme a atitude, a "tradição da representação" habituais da época: os atores "diziam" o texto, preocupados, imagino, com a beleza formal, e a peça fracassou. Foi necessário vir Stanislavski, que estudou a escola de Tchecov, reconheceu sua figura própria, isto é, o estilo impressionista. Partindo da natureza do texto, ele percebeu que era necessário encontrar a continuidade de vida e de amor dos personagens por trás do texto para que ele finalmente tivesse um sentido dramático. Foi a invenção do que os americanos e ingleses chamavam de "subtexto", e o ponto de partida de todas as improvisações realistas destinadas a nutrir o jogo dos atores pela descoberta de uma continuidade psicológica por detrás do texto.

Perigo

Descoberta preciosa para o teatro realista, impresisonista e elíptico; descoberta perigosa quando é aplicada sem discriminação a todos os estilos: ela leva, se levada ao exagero, à criação na consciência dos atores, de um mundo essencialmente psicológico, emocional e subjetivo, que pode entrar em conflito com o estilo das obras em que a psicologia tem menos importância e que a união da forma e de conteúdo é indissolúvel.

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Este artigo, aqui resumido, foi extraído da revista Cadernos de Teatro nº 58/1973, edição já esgotada.

terça-feira, 2 de junho de 2009

Commédia Dell'arte

Surge em meados do século XVI, atinge seu apogeu no século XVII e declina no século XVIII.

Tem provável origem nas fábulas atelanas e nos tipos fixos plautinos, acrescidos da cultura popular medieval e da união de diversos artistas de rua em grupos para sobreviver, dada a crise econômica que se abateu sobre os principados itálicos nesse período.
Eram elementos essenciais da commédia dell'arte: o profisisonalismo, a itinerância, o uso de máscaras e a improvisação.

O teatro mascarado da commédia dell'arte não estava vinculado a qualquer tipo de texto, era apresentada a qualquer tipo de público, o ator era especializado em um único tipo (personagem), eram formadas trupes de atores que variavam de 8 a 12 atores e as mulheres tomavam parte na representação.

Havia, em geral três tipos de personagens:

- Os Zanni (criados) - Arlequim, Briguela, usava-se máscara e o tom era permanentemente cômico;

- Os Vecchi (velhos) - Pantaleone, Dottore, usava-se máscara e o tom também era cômico;

- Os enamorados - não usavam máscara e eram o contraponto sério das peças.




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